quarta-feira, 19 de março de 2008

Por que não existe a dicotomia tácito-explicito ?

Prezados

O termo “dicotomia” entendido como uma divisão lógica de um conceito em dois outros conceitos, em geral contrários, que lhe esgotam a extensão, não se aplica ao conhecimento tácito e explícito. O termo “dualidade” vem sendo utilizado com mais propriedade.
No artigo que iniciou esta série de postagem, Grant mostrou de forma clara que Polanyi (1958, p 87-101 apud Grant,2007,p. 177) conceituou o conhecimento tácito e o conhecimento explícito, não como uma dicotomia e expressou isso por um diagrama, mostrado na figura abaixo(clique na figura para ampliá-la):



Esse diagrama mostra um preceito básico nas idéias de Polanyi que todo o conhecimento inclui um certo grau de "tacitude" e deve ser visto como um continuum, no qual um ou outro tipo de conhecimento pode prevalecer.
Esse continuum varia de uma situação onde haja pouca "tacitude" no conhecimento, podendo ser apreendida por muitas pessoas, mesmo aquelas com limitado background sobre o assunto em questão. Passa por uma situação onde somente os especialistas podem compartilhar o conhecimento tácito devido a seu background comum, treinamento especializado e experiência. Evolui para a situação onde há um forte elemento pessoal no conhecimento, que é muito difícil de expressar. Finalmente alcança o ponto no qual é impossível articular o conhecimento (conhecimento “inexprimível, inefável”).

O grau de clareza está diretamente relacionado ao uso da linguagem. Onde há um alto grau da aceitação e uso de uma linguagem específica (falada, escrita ou representada), o conhecimento pode ser altamente explícito à maioria. Onde um nível mais sofisticado de conhecimento e de experiência é necessário para que a linguagem tenha significado, o nível de "tacitude" compartilhada necessária aumenta. É nesta área que se pode posicionar o conceito do conhecimento “implícito”, um conceito que, como destacado por Grant, não foi discutido por Polanyi, mas freqüentemente é oferecido, de forma errônea, como uma alternativa ao conhecimento tácito.

Este modelo sugere que o conhecimento implícito pode ser descrito como o conhecimento que parece ser tácito, mas que pode ainda ser explicitado, embora não o precise ser, em uma comunidade que compartilhe de uma visão comum do conhecimento tácito necessário.

Forte abraço

Fernando Goldman

2 comentários:

Sérgio Storch disse...

Fernando
Parabéns por tanta clareza para um post tão curto... Por que será que a maior parte dos autores deixou que esses conceitos tão fundamentais se vulgarizassem e perdessem essas sutilezas?
Mas acho que essa discussão ainda não pega um outro componente do conhecimento, que foge à dualidade tácito-explícito: o conhecimento do tipo "não sei que sei" que precede as grandes sacadas diante de um problema. Está aquém do tácito, mas existe...
Taí material para novos posts...

Sérgio Storch

Fernando Goldman disse...

Prezado Sérgio

Obrigado por suas palavras. Quanto a esse conhecimento do tipo "não sei que sei" que precede as grandes sacadas diante de um problema, talvez ele esteja mais ligado aos processos de assimilação e acomodação descritos por Piaget.

Uma vez que você tenha produzido uma grande sacada, diante de um problema, provavelmente, isso, segundo Piaget, foi possível devido a uma assimilação produzida por uma acomodação dos seus esquemas, ou seja, uma modificação na sua estrutura de conhecimento, que te permitiu resolver um novo tipo de problema para o qual você ainda não tinha um “esquema” formado.

Aí sim, cabe analisar o grau de "tacitude" desse novo conhecimento, desse “saber” que te possibilitou uma ação eficaz.

Verificar se ele é passível de ser todo explicitado, ou se para explicitá-lo você precisará de uma linguagem muito especializada, ou ainda se ele está inefável e por aí vai.

Forte abraço

Fernando Goldman