Prezados
A primeira das características das empresas longevas levantada por De Geus – a de serem sensíveis ao próprio meio para poder aprender e se adaptar ( ver postagem anterior) – está diretamente relacionada ao conceito bastante difundido desde a década de 80, de que: "A capacidade[1] de aprender mais rápido que os concorrentes é a única vantagem competitiva sustentável[2] a longo prazo para uma organização"[3].
As empresas longevas são altamente sensíveis ao meio em que estão inseridas, ao seu ambiente de negócios e às demais esferas que as envolvem. Um conceito importante que De Geus[4] chamou de "ecologia". Além de estarem capacitadas, elas estão prontas e desejosas de se reinventarem continuamente, não só para se manterem vivas em seu meio, mas gerando retorno e crescimento a partir dele. Isso exige ter a capacitação de aprender e se adaptar sempre e incluir essa capacitação no processo de tomada de decisão em si, um insight essencial naquele livro.
Assim, é natural, por exemplo, que a Fundação Nacional da Qualidade tenha elegido o Aprendizado[5] Organizacional como um dos pilares de seu Modelo de Excelência[6].
O Aprendizado Organizacional, com cada vez maior importância na competitiva e instável sociedade em que vivemos, é a princípio uma metáfora – dado que aprender seria prerrogativa de seres vivos.
Assim, não é de se estranhar que, por exemplo, os argumentos fundamentais da construção teórica da abordagem neoschumpeteriana[7], sobre as mudanças técnicas e econômicas[8], tenham sido construídos com base em analogias com a concepção evolutiva das Ciências Biológicas[9].
Dentro dessa abordagem, evidencia-se a inspiração biológica através da identificação de três importantes aspectos nos comportamentos das organizações[10]:
• Os elementos de permanência ou hereditariedade;
• Um princípio de variações ou mutações;
• Os mecanismos de seleção.
Vale dizer que mais recentemente, o pensamento neo-schumpeteriano vem se desenvolvendo para além dessas analogias com a concepção evolutiva das Ciências Biológicas, incorporando conceitos do Pensamento Complexo, por exemplo, a auto-organização[11] como elemento explicativo do caráter dinâmico e evolutivo dos sistemas econômicos[12].
Há assim a necessidade de melhor compreensão das relações entre constructos[13] como Inovação, Conhecimento e Aprendizado Organizacional[14], sendo o referencial teórico sobre esses temas amplo, complexo e há muito se tornado objeto de estudo de diversas disciplinas[15].
Forte abraço
Fernando Goldman
[1] Assim como acontece no idioma inglês, onde as palavras capability e capacity são muitas vezes usadas indistintamente, em português a correta distinção entre as palavras 'capacidade' e 'capacitação' nem sempre é levada em consideração. No presente texto, sempre que possível, será dada preferência à palavra 'capacitação' para expressar uma habilidade ou competência, embora em algumas citações seja necessário respeitar à fonte original.
[2] Teece, Pisano e Schuen (1997, p. 516), por exemplo, definem recursos como ativos específicos da organização, difíceis - quando não impossíveis - de serem imitados ou transferidos entre arranjos organizacionais devido aos custos de transação e de transferência e por conterem conhecimentos tácitos.
Em uma abordagem típica da Visão Baseada em Recursos (VBR), Barney (2007) foca os recursos internos de uma organização como os reais elementos capazes de potencializar a vantagem competitiva sustentável e apresentam uma análise baseada em quatro questões que devem ser formuladas sobre um recurso específico para determinar seu potencial para a competitividade da empresa. A questão do valor: O recurso permite que a empresa explore oportunidades e/ou neutralize ameaças? A questão da raridade: O recurso é controlado apenas por um pequeno número de empresas concorrentes? A questão da imitabilidade: As empresas que não possuem esse recurso enfrentam custos proibitivos para obtê-lo ou para desenvolvê-lo? A questão da organização: As políticas e processos da empresa estão realmente organizados para apoiar a exploração de seus recursos valiosos, raros e custosos de imitar?
[3] (DE GEUS apud SENGE, 1990, p.12)
[4] (1998, p.120)
[5] As palavras "aprendizado" e "aprendizagem" são encontradas como traduções de "learning" na literatura sobre organizações, em português, e serão usadas aqui indistintamente.
[6] (FNQ, 2008)
[7] Sob inspiração dos trabalhos de Joseph Alois Schumpeter (Triesch, 8 de Fevereiro de 1883 — Taconic, 8 de Janeiro de 1950), a abordagem neo-schumpeteriana se apresenta como uma contraposição teórica às representações neoclássicas da tecnologia e do progresso técnico, oferecendo uma análise da tecnologia que coloca a dinâmica tecnológica como motor do desenvolvimento das economias capitalistas.
[8] Em especial, Nelson e Winter (1982) propuseram uma Teoria Evolucionária da Mudança Econômica, que – segundo Tigre (2005) – pode ser considerada um novo paradigma na construção de uma Teoria da Firma.
[9] Pode-se e deve-se estabelecer uma distinção entre a literatura sobre o Aprendizado Organizacional e o Aprendizado Tecnológico. Isso será feito ao longo das próximas postagens.
[10] (CORAZZA; FRACALANZA, 2004, p.127)
[11] Segundo Hodgson (2002), vários cientistas sociais, incluindo os "economistas evolucionistas, vêm expressando ceticismo sobre as "analogias biológicas" e rejeitando a aplicação do "darwinismo" para a análise da evolução socioeconômica. Argumentam que a auto-organização seria uma alternativa às analogias biológicas ou darwinismo. Outros têm visto a 'seleção artificial' como uma alternativa à seleção natural na esfera socioeconômica. Outra objeção seria que o darwinismo exclui a intencionalidade humana.
[12] (CORAZZA; FRACALANZA, 2004, p.127)
[13] O termo "constructo" será utilizado aqui como uma "construção puramente mental, criada a partir de elementos mais simples para ser parte de uma teoria."
[14] A inovação não será entendida aqui, como é comum acontecer, apenas no sentido de mudança técnica, mas, sim, no sentido schumpeteriano de inovação tecnológica, em produtos, processos, serviços, formas de organização, modelos de negócios, fontes de matérias-primas, etc.
A inovação pode criar uma vantagem competitiva para o arranjo organizacional propiciando resiliência face à mudança e aos choques imprevisíveis. Ao pensar a inovação dessa forma, os o arranjos organizacionais podem evoluir e se adaptar para gerar a longo prazo posições sustentáveis em seus mercados e países.
Um ponto de especial interesse na literatura sobre os arranjos organizacionais diz respeito à Ambidestria Organizacional, ou seja: como apoiar e integrar a inovação produtiva em todas as facetas da vida organizacional para lidar com a certeza das mudanças futuras e ainda satisfazer as demandas do mercado e das partes interessadas no presente?
GOLDMAN, Fernando Luiz. Leilões da transmissão de energia elétrica no Brasil de 1999 a 2006: uma avaliação do aprendizado organizacional de segunda ordem. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) - Universidade Federal Fluminense, Niterói, Rio de Janeiro, 2008.
Fernando
ResponderExcluirDesta única vantagem competitiva sustentável definida pelo De Geus, podemos ler no manual impublicável da KM que basta manter em seus quadros o pessoal mais "safo". É adotar a estratégia do Ex-CEO da GE cujo nome não lembro agora. Fato que mostra que as empresas espertas já utilizam este expediente!
Abração
Ferdinand
Lembrei o nome do cidadão Jack Welch!
ResponderExcluirEle sempre premiava os 20% melhores de seu corpo gerencial, aconsehava os 70% para que se mexessem, e dispensava os 10%de pior desempenho. Imaginem o terror que estava instaurado nesse modelo. Mas os acionistas adoraram.
KM, era só o CEO que praticava!